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quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Pessoas com esquizofrenia podem ter dificuldade em reconhecer rostos humanos



Por Gabriela Albuquerque

A esquizofrenia é um transtorno mental incapacitante, que geralmente se manifesta na adolescência ou no início da idade adulta. O transtorno é caracterizado pela dissociação entre o que é real e o que é imaginário por parte do indivíduo, provocando distorções no pensamento, na percepção, nas emoções, na linguagem e no comportamento. Além disso, a pesquisadora Melina Medeiros de Miranda Lima comprovou que pessoas com diagnóstico de esquizofrenia também podem apresentar prejuízo no reconhecimento facial com distratores e dificultadores. Sua dissertação de mestrado, “Reconhecimento de Identidade de Faces em Pessoas com Esquizofrenia”, foi defendida, este ano, no Programa de Pós-Graduação em Psicologia (PPGPsi), vinculado ao Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e teve orientação da professora Aline Mendes Lacerda.


Há mais de 15 anos, o Laboratório de Percepção Visual da Universidade Federal de Pernambuco (LabVis-UFPE) deu início a uma série de pesquisas investigando possíveis alterações sensório-perceptuais em pessoas com transtornos neuropsiquiátricos. A partir dos estudos desenvolvidos pelo laboratório e das queixas de pessoas esquizofrênicas referentes à dificuldade de reconhecer ou diferenciar faces, Melina Medeiros partiu do pressuposto de que sintomas e alterações cognitivas, próprios da esquizofrenia, são precedidos por modificações sensoriais. “Reconhecer a identidade facial é um aspecto importante para o desenvolvimento e bem-estar social do indivíduo, uma vez que ter dificuldades em diferenciar e reconhecer faces pode trazer sofrimento e insegurança”, aponta a pesquisadora.


Sendo assim, foi construída a Tarefa de Reconhecimento de Identidade Facial (TRIF), que foi utilizada como instrumento de análise. A TRIF recrutou 12 voluntários, sendo seis mulheres e seis homens de 35 a 45 anos de idade, faixa etária mais acessível durante a pandemia de covid-19, período no qual o banco de imagens do estudo foi formado. Os registros das 12 faces foram divididos em duas etapas: enquanto na primeira foram feitos os registros das faces femininas sem elementos distratores ou dificultadores, na segunda, foram feitos os registros das mesmas faces com a adição desses elementos (batom vermelho escuro, rímel, lápis de olho e blush). Por sua vez, as faces masculinas foram registradas inicialmente com barba e, posteriormente, sem barba.

Parte da pesquisa foi realizada no Hospital Psiquiátrico Ulysses Pernambucano, no Recife (PE). Homens e mulheres com idades de 25 a 55 anos participaram do estudo, totalizando 43 voluntários divididos em dois grupos: um Grupo Controle (GC), formado por 23 indivíduos sem quaisquer distúrbios mentais, e um grupo de voluntários do hospital (GHUP), que corresponde a 20 pessoas diagnosticadas com esquizofrenia. Todos os testes foram conduzidos em apenas uma sessão, que durou cerca de 50 minutos.


Os testes indicaram que, enquanto o GC registrou um desvio de acertos de 4,70, o GHUP apresentou 7,13, demonstrando que os pacientes com esquizofrenia possuíram maiores dificuldades na tarefa objetiva de reconhecer as faces quando comparados com indivíduos sem o transtorno e confirmando que os distratores, elementos do cotidiano como maquiagem e barba, atuam dificultando ainda mais esse reconhecimento. Além disso, Melina Medeiros salienta “a correlação positiva, ainda que fraca, entre o número de acertos na TRIF e a pontuação em questionário de autoconhecimento sobre a capacidade de reconhecer faces, ou seja, as pessoas sentem ou percebem, em seu dia a dia, uma dificuldade para reconhecer rostos”.


Para o estudo, foi realizada uma entrevista semiestruturada, que levou aproximadamente dez minutos, para coletar informações gerais sobre as questões sociais e clínicas do voluntário, cujas respostas foram categorizadas. Posteriormente, os participantes realizaram o teste de rastreio de acuidade visual Snellen, que durou aproximadamente cinco minutos, seguido do Miniexame do Estado Mental (MEEM), que demandou cerca de 15 minutos, para avaliação das funções cognitivas. O teste de acuidade visual foi empregado para excluir os voluntários que não apresentavam acuidade visual normal ou corrigida. Já a pontuação do MEEM foi calculada em escore bruto do teste e correspondeu ao número de respostas corretas.


Finalmente, a TRIF foi apresentada em um computador a uma distância de 80 centímetros de espaço entre a tela e o encosto da cadeira na qual o voluntário estava sentado. A tarefa foi iniciada a partir de uma instrução que orientasse o indivíduo a reconhecer e relacionar as faces de seu banco de dados o mais rápido possível. “Os resultados obtidos corroboram com os estudos e dados internacionais sobre o prejuízo no reconhecimento de identidade de faces em pessoas com o diagnóstico de esquizofrenia e ainda confirmam nossa hipótese de que os distratores ou dificultadores atuaram dificultando o reconhecimento de identidade de faces”, conclui Melina Medeiros.


A pesquisadora ressalta ainda o valor das descobertas científicas relativas à saúde mental, que impulsionam a compreensão de doenças e distúrbios psíquicos, bem como a criação de estratégias que visem a auxiliar a população, caminhando em direção a uma sociedade mais inclusiva. “As alterações ou prejuízos no reconhecimento de faces em pacientes com esquizofrenia já são um achado bem fundamentado em estudos da área. Apesar disso, não existem, até o momento, pesquisas ou dados brasileiros sobre a temática estudada”, destaca. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a esquizofrenia é a terceira causa de perda da qualidade de vida no planeta. No Brasil, estima-se que há cerca de 1,6 milhão de pessoas diagnosticadas com esse transtorno.


Fonte: Ascom UFPE

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