Por Allane Silveira
Os desastres decorrentes de períodos de fortes chuvas têm se tornado cada vez mais frequentes com as mudanças climáticas. Apesar de esses eventos causarem transtornos a toda a sociedade, seus impactos são maiores junto à população de baixa renda, que geralmente mora em áreas mais vulneráveis. Pensando nesse problema, a pesquisadora Camila Salgueiro analisou formas de minimizar os danos causados por grandes precipitações nessas áreas. Em seu estudo, Camila buscou alternativas para melhorar o sistema de drenagem das águas das chuvas, diminuindo o volume de água que escoa pelas ruas de um morro localizado no bairro Ibura de Cima, no Recife, sendo o uso de caixas d’água uma boa alternativa. O estudo foi realizado no curso de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Campus Recife. Desenvolvida sob orientação da professora Sylvana Melo dos Santos, do Grupo de Recursos Hídricos, a pesquisa resultou em uma dissertação defendida, em 2024, intitulada “Análise de Drenagem Urbana em Área de Morro: estudo de caso em Recife”.
Para escolher a área a ser analisada, Camila avaliou os níveis de urbanização e os índices de chuva em Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes, cidades importantes da Região Metropolitana do Recife. O Recife foi selecionado devido ao seu crescimento urbano, que aumentou 68,77 km² entre 1985 e 2021. Por outro lado, os dados pluviométricos, fornecidos pela Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac), mostraram que a cidade teve um volume de chuvas acima da média anual em comparação com Olinda e Jaboatão. A pesquisadora analisou o ano de 2022 e verificou que o mês de maio foi o mais chuvoso, com 635,22 mm de chuva, sendo o dia 28 de maio o mais intenso, com 145,33 mm de precipitação. Para identificar o morro a ser estudado, foram analisados dados da Defesa Civil do Recife coletados nos dias 27, 28 e 29 de maio de 2022. O bairro Cohab (Ibura de Cima) se destacou, apresentando 108 chamados registrados, levando a pesquisadora a selecionar um dos morros do bairro.
Camila contextualiza as características urbanas e geográficas que compõem o cenário analisado no Recife. “O volume de água que contribui para a ocorrência deste tipo de evento está ligado ao uso e ocupação do solo, uma vez que a substituição da vegetação (permeável) para telhados e logradouros (impermeáveis) faz com que a água, que antes infiltrava, passe a escoar na superfície terrestre. Tal situação é ainda mais delicada em áreas de morros, visto que a diferença de níveis de elevação faz com que essa água escoada passe a apresentar uma velocidade mais elevada, assim contribuindo para a ocorrência de enxurradas e deslizamentos. Somado a isso, a modificação da superfície e o consequente aumento do quantitativo dessa água escoada fazem com que chegue até os dispositivos de drenagem urbana uma contribuição que muitas vezes não era prevista em projeto, gerando uma insuficiência do sistema frente a eventos de precipitação”, detalha.
A partir de visitas técnicas, a pesquisadora coletou dados para análise da segurança do sistema de drenagem da água da chuva no local. Camila selecionou para a análise três sarjetas e quatro descidas d’água. “Com a definição total da área e conhecimento das suas condições, foi possível entender o comportamento do fluxo de drenagem urbana no morro. Assim, estimou-se a quantidade de água que escoa até cada dispositivo, considerando os parâmetros de uso e ocupação de solo e a intensidade da chuva associada com uma duração de 10 minutos”, explica.
Foi identificado que uma das sarjetas não tem capacidade para suportar o volume de água gerado pela chuva intensa, especialmente devido à contribuição de outras fontes de escoamento além das chuvas, como esgoto sanitário. “O estudo em questão apontou a ineficiência no aporte pluvial para a condição atual de uma das sarjetas, fator que, associado a um evento extremo de precipitação, pode vir a contribuir para a ocorrência de alagamentos na área. Diante disso, foram realizadas avaliações visando à busca por metodologias de diminuição do volume excedente, com análise de técnicas compensatórias”, conta. Foram analisadas três soluções para reduzir o fluxo de água: telhados verdes convencionais, caixas d’água para armazenar água da chuva e telhados ecológicos de baixo custo.
A pesquisa usou uma técnica chamada Processo Analítico Hierárquico (Analytic Hierarchy Process - AHP) para comparação dessas alternativas. Essa metodologia visa criar uma base de estudos para ajudar a resolver uma questão. Para tanto, a complexidade de um problema é reduzida ao dividir e simplificar suas partes, criando relações e hierarquias entre elas, definindo prioridades e garantindo consistência lógica. No caso da metodologia AHP, para tomar decisões, é preciso escolher e organizar as principais dimensões e variáveis do problema. Nesse estudo, foram consideradas três dimensões principais para a tomada de decisão entre as alternativas consideradas: Aspectos Hídricos, Aspectos Operacionais e Aspectos Socioeconômicos.
Os Aspectos Hídricos envolvem a capacidade de infiltração; qualidade da água captada; e capacidade de reuso da água. Os Aspectos Operacionais são a complexidade de implementação; manutenção; e melhorias no conforto térmico do ambiente. Os Aspectos Socioeconômicos considerados foram custos; prazo da execução; custos de manutenção; e lucros extras. Para coletar informações sobre essas variáveis, foi aplicado um questionário junto a 43 pessoas de diferentes áreas da Engenharia Civil, a fim de analisar diferentes pontos de vista sobre o problema. O questionário tinha 18 perguntas divididas em seis seções, com respostas que comparavam o nível de relevância entre as variáveis.
A conclusão foi que a melhor solução é a instalação de caixas d’água, que obteve a melhor avaliação, ajudando a reduzir o impacto das chuvas no sistema de drenagem da área. A implementação de caixas d'água obteve melhor avaliação em todas as variáveis, com exceção de “Melhorias no Conforto Térmico do Ambiente” e “Lucros Extras”.
A implementação de caixas d’água se destaca por demonstrar maior capacidade de retenção da água da chuva, o que facilita o seu reuso. Já na utilização de telhados verdes, a água entra em contato com várias camadas, como vegetação e substrato, influenciando, dessa forma, os parâmetros de qualidade da água. Outro ponto em que os telhados verdes se saem pior é na sua instalação, que pode causar danos à laje, sobrecarga na estrutura e problemas de infiltração. Também é necessário um projeto e acompanhamento especializado para a sua manutenção, o que não ocorre com a implementação de caixas d’água.
Em relação aos custos, as caixas d’água também saem ganhando, com um custo médio local no Recife de R$ 250. Adicionalmente, como se trata de um produto que se adquire já pronto para uso e que não precisa ser montado, sua implementação tem um prazo de execução curto. Considerando a variável manutenção, os reservatórios em caixas d’água também se saem melhor, pois tem-se como procedimento padrão a necessidade apenas de limpeza frequente.
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